terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Ia falar de amamentação, mas, pra ser fiel ao rosário dos falados tabus maternos, como não começar pela questão do parto.
Que loucura é essa dessa pressão hoje em dia pro parto normal!
Êêê ser humano véio que com tanta facilidade entra na cela, passa o cadeado, some com ele e fica sem entender porque se sente tão mal depois...
Ouvi outro dia de uma amiga - no finalzinho de sua gravidez e admiravelmente livre quanto a isso - que, pesquisando, ela soube que antigamente, no comecinho da técnica da cesárea (lá por 1.800 e alguma coisa), a igreja católica logo se antecipou dizendo que fazer um parto desses era pecado, pois não se podia fugir, imaculadamente, às dores do parto.
Quem está grávida, acabou de estar ou se antena nesses assuntos, pense no discurso (expresso ou velado) que ronda por aí e me diga se qualquer semelhança é mesmo pura coincidência. Não parece ser. Pra mim é essa macabra propensão nossa de aprisionar (-se) que falei. Antes, institucionalizada, via igreja. Hoje, vaporizada por aí por todo canto.
Que há vantagens do parto normal sobre o cesáreo ninguém discorda. Mas que há também vantagens da cesárea sobre o parto normal pouca gente se lembra. E amaldiçoa-se quem, diante dessas vantagens ou por tantas outras razões, opta pela cesárea.
O caminho, acho, deveria ser bem outro. O que deveria ser apoiado, muito mais que um modo de parto ou outro, é, depois do colhimento de todas as informações, o mergulho honesto de cada uma dentro de si atrás, li-vre-men-te, da experiência que mais apetece ou que lhe é mais possível. Não é melhor mãe, nem melhor pessoa, aquela que sonha com um dolorosamente emocionado trabalho de parto de 10 horas do que a que, assim que sabe estar grávida, marca no calendário sua cesárea ao fim da 37ª semana. Isso é de um reducionismo burro e irritante. Mas veja aí se não é exatamente essa a mensagem subliminar que tem rolado solto.
Na minha experiência, eu queria o parto normal. Aliás, mais que o parto normal, eu sonhava mesmo era com o trabalho de parto. Fiz um curso muito legal durante a gravidez que focou nisso e ficava imaginando como seria bacana eu e o pai, só nós, na nossa casa, por algumas horas, bêbados na emoção de abrir-alas pra nossa filhota.
Não foi possível. Fui até o último segundo que o médico esperava e nada. Não saiu sinal de sangue, a bolsa não estourou, Manú não encaixou, o colo não abriu titica de nada. Não tive nem uma contraçãozinha sequer. Meu corpo simplesmente não funcionou.
Fiquei bastante frustrada sim, mas logo me veio forte que isso não poderia ter essa importância toda; o que mais interessava iria acontecer de qualquer jeito no final, eu iria conhecer minha filha. Assim, botei na cabeça que, só pelo fato de anteceder esse colossal momento da minha vida, seria a mais linda cesariana do mundo. Tudo bem que mesmo sentada na mesa da operação, já tomando a anestesia, cheguei a perguntar pro médico "doutor, não quer dar a última olhadinha pra ver se eu não dilatei um pouquinho?", deixando entrever o quanto ainda estava insatisfeita com aquela situação. Mas, juro, hoje o fato de ter tido uma cesárea é tão pequeno perto de tudo que tem rolado que tenho demorado uns segundos pra me sintonizar com a pergunta comum de por qual via foi o meu parto. Parto? Ah, fiz cesárea. Sinceramente, a mais linda cesárea. (;

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

De concreto...

Esse blog tá parecendo minha análise. Começou há três anos atrás com o objetivo de falar de umas duas, três coisas específicas e, até hoje, se for espremer, não falei praticamente nada sobre essas coisas mas de tantas outras intermináveis. Vai entender.
A idéia inicial do blog era, mais do que desabafar minhas vãs viagens, a de colocar na roda os tabus da maternidade. Sim, tabu, pois se me espantei com alguma coisa desde que aquelas duas listrinhas apareceram pra mim é quantos tabus - caretices, prisões, não-ditos, mal-entendidos, talvez fossem melhores palavras - cercam a situação "mãe". Aliás, se não fosse de gosto tão duvidável, minha intenção era batizar o blog no estilo "save the mothers!", "free the mothers já!", algo assim.
Liberdade... Sem dúvida uma das coisas mais difícies - e, na mesma proporção, fundamental - da vida. De viver, de se oferecer, de se conviver. Com relação à maternidade, na minha opinião, mais difícil e mais fundamental ainda.
O fato é que nunca tinha, nesses meus 32 aninhos de bate-bate, experimentado nada que tivesse me colocado tanto na berlinda quanto ter virado mãe. Digo, na mira do julgamento de todo mundo; na mira, pior, do meu próprio e constante julgamento. Hasta la vista liberdade!
Que todo o mundo tem palpite sobre tudo do universo mãe, sabemos; mas que nesse palpite vem quase que inevitavelmente embutido um julgamento que tememos, poucos admitem. Mas vem. E isso é baixo-astral, pra se dizer o menos. Deprime.
Muitas razões, penso, pra isso. A primeira, mais óbvia e mais forte na minha opinião, é que talvez a maternidade (leia-se também paternidade e outros arranjos) seja, depois das experiências puramente orgânicas, a experiência mais democrática do planeta. Desde o começo dos tempos, em todo lugar em que há vida humana, até agora e por quanto durar a espécie, engravida-se, pari-se, cria-se. Nada mais natural, então, do que perto da totalidade das pessoas terem opinião sobre tudo o que envolve a questão. E daí ter idéias, concepções que, a não ser em espíritos mais evoluídos, vão ser a inevitável base para se julgar a primeira e todas as outras mães que se vir pela frente. A começar por si, o que pode acabar numa m. enorme.
Bom, não ia teorizar e já tô teorizando... Ô canseira.
O que eu queria mesmo era dar só uma introducãozinha pra começar a falar dos perrengues mais concretos que passei e venho passando e que, pelos tais tabus, acho muito pouco escarafunchados e, por isso, fantasmagóricos. Exorcizemos!
Tô com vontade de começar pela amamentação (ou não amamentação), que tanto me chateou. Mas no próximo post, pois agora... adivinha? Buá, buá, buá, buá...
ps: não tô conseguindo responder aos comentários, tão legais, que estão deixando... Vou tentar ver se aprendo melhor mexer nisso aqui, mas, por enquanto, saibam que tudo está sendo deglutido vorazmente por mim e a energia boa que vem disso prontamente sugada! Que maravilha ter vocês pra compartilhar!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Não é que vai passando mesmo?




Amanhã Manú completa dois meses. E, sem muita explicação, nesses últimos dias nosso tête-à-tête tem sido ineditamente só bom. Parece que o desembestado trem da coisa tá começando a encontrar seus eixos. Nem acredito.


Eu já tinha ouvido de muita gente "vai passar". E não é que duvidava. Eu só achava que comigo provavelmente ia ser diferente e eu ia acabar sendo aquele pontinho que sempre há fora da curva.


Felizmente, bem acima do meu pessimismo, caminhamos e eu cá estou deslumbradinha da silvassauro! Não que antes não estivesse feliz também - estava e muito-, mas, ó santa ambigüidade, a angústia era tamanha que pelo menos na metade das horas a decantada felicidade ficava lá guardadinha no mais cafundó de minh'alma. Passava.


O que mudou? O que fez a voz "meudeusdocéu, como é que é possível isso de eu ter agora um bebê no quarto ao lado???" virar algo como "meu Deus, eu não merecia tanto, temos um bebê no quarto ao lado!!!"?


Poderia dizer que são os sorrisos dela cada vez mais freqüentes e que me entortam de alegria (tema do post passado). Ou ela me dando língua quando faço o mesmo pra ela. Pode ter a ver com o fato dela ter descoberto o móbile do berço e agora se distrair por sagrados minutinhos com ele. Tem também o arroto que tá saindo mais fácil e as golfadas que diminuíram. A rotina do banho à noite, que tá dando certo e tem feito ela pegar no sono sem tanto custo. O jeito que eu peguei pra embalá-la e ela se esquecer de chorar. Sem falar nas esticadas do sono da noite que têm batido récorde.


Quem é mãe ou afim sabe, tudo isso são novidades maravilhosas e, claro, muito têm me relaxado.


Mas desconfio que o "x" da questão é algo pra além disso tudo. Desconfio que esses 2, 3 meses do famoso "vai melhorar" são, mais do que o tempo de um desenvolvimento do neném que traz conforto pros cuidadores, o tempo que nós, de primeira viagem, precisamos pra internalizar de verdade o looping que nossa vida deu, a mudança gigantesca que ocorreu; fazer o luto do que há de ser deixado pra trás, nos entregar sem reservas ao que tá rolando agora. É o tempo afetivo, psicológico, sei lá, que parece levar pra que giremos uma tal chave aí - no popular, pra cair a ficha geral. É o que custa, quem sabe, pra olhar pro mesmo bebê apavorante do começo e, mais do que os desafios que ele lhe trouxe, conseguir enxergar, ali óbvias, as fantásticas possibilidades que ele lhe abriu. É o que demora, talvez, pro percurso interno maternidade-casa: trazê-lo, agora pra valer, pra se estabelecer em sua vida, ocupar o seu espaço, fincar suas raízes (profundas, profundas). É o velho "se acostumar com a idéia" que, em se tratando dessa coisa louca de boa que é ganhar um filho, certamente precede o "se empolgar com a idéia" e, finalmente, o "não viver mais sem a idéia".


Enfim, só sei que, ao abrir hoje essa página pra escrever, o título "Manú e eu" nunca tinha feito tanto sentido pra mim. Sim, estamos mais juntas do que nunca, mais perto do que barriga nenhuma tinha conseguido fazer conosco. Entrei definitivamente pra turma do "passa". (;

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Vai um sorriso aí?

Se Manú soubesse o poder desse sorrisinho que ela começou a disparar há uns dias... É só os cantinhos da boca dela insinuarem se esticar um pouquinho pros lados e ela derrete imediatamente quem estiver na frente, que se rende ali na hora, pactua com ela no ato. Fico pensando de onde vem isso, essa ternura enorme, essa esquentada no peito, que dá ao vermos, para nós, um sorriso de bebê apontado. Só pode ser coisa do bebê que ainda somos, e pra sempre seremos (não importa quanto verniz de adulto a vida já tenha nos pregado), dando sinal. Papai, mamãe, vovôs, vovó, tias, tios, transeuntes anônimos: é o bebê que não morre em ninguém que, fico imaginando, enlouquece com o sorriso do bebê presente de Manú. Esses bebêzinhos eternos que somos e que tudo, tudo, tudo o que querem se resume a serem tidos como especiais, únicos pra alguém, quem sabe; serem cuidados, aceitos e amados do jeitinho que vieram ao mundo, nem mais nem menos. Nós, essas pessoinhas que cresceram e infelizmente aprenderam rápido que pedir isso aos outros assim expressamente, direto, na lata, pode assustar e pegar mal - pior, pode render efeito contrário. Então o "melhor" é manobrar com todos os subterfúgios já inventados (e inventados exatamente pra isso), como ser bacana, bonito, inteligente (pra ficar só nos positivos), tentando dar corda no amor dos outros que tanta falta nos faz. Por isso, acho, sermos tão fortemente abduzidos por esse simples esboço de sorrisinho. Tão simples, tão sincero, tão imediato, tão aliviador: te viu e gostou do que viu. Sorriu.

(...)

Enquanto rezo todo dia pra Manú soltar vários desses risinhos pra sua babá - e assim ajudar a amarrá-la de vez aqui em casa (; -, tenho recebido alguns deles só pra mim! O primeiro, há uns dias atrás, foi assim de repente, sem ensaio que eu percebesse. Voei na hora pra pegar a máquina e, repentindo a gracinha que tinha feito com ela, consegui a proeza de filmar o segundo sorriso de Manú pra sua orgulhosa mamãe. Aí no vídeo ao lado (começa com um chorinho, mas no final tem o sorriso!).

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Filhosofando...


"Por quê/pra quê ter um filho?" é pergunta, acho, da mesma família de "por quê/pra quê a gente vive?", estando no mesmo balaio também de coisas do gênero "de onde viemos?", "pra onde vamos?", "o que realmente fazer de importante nesse meio tempo?". Perguntas sem resposta - ou melhor, abertas pra tantas possíveis que objetivamente não se pode apontar nenhuma, ficando pra cada um o dever de casa de arquitetar a própria (simplória ou panfletária, com uma bela exclamação ao final ou um enigmático outro ponto de interrogação, copiada ou autêntica, espiritualista, biológica ou intelectual, sofisticada, convicta ou meio troncha). É nela que a gente vai se agarrando, se salvando, crescendo, encontrando, amando... e tendo filhos!

Olho pra pequenina Manú e penso "como foi que você veio mesmo parar aqui?" (na falta de coragem de ir mais na lata e perguntar, na verdade, como foi mesmo que eu vim parar aqui...). E já estou lá em 99, eu e o pai dela nos conhecendo, enredados na nossa improvável paixão, e tudo o mais dessa história que tinha tanto pra não dar em nada e, de repente, foi dando em tudo... Inclusive nesse 13 de outubro último, onde outro ser humano (que logo logo não vai escapar de ter que achar as suas respostinhas também), pimba!, surgiu da gente - ou, em outras palavras, da nossa aventura de tentar, em parte juntos, endereçar as tais perguntas...

Não há sentido pra se ter um filho - não ao menos desse palpável, explicável, demonstrável. Assim como não há muito sentido também em se estar vivo (e essa vida é besta, besta mesmo). Há, no entanto, o prazer. Há o realizar. Há o crescer, saber mais sobre as nossas ondas e ir atrás delas. Há pegar essa carinha aí da foto ao lado te encarando. Há tê-la no colo e sentir seu cheirinho que não existe igual. Há escrever aqui e imaginar vocês lendo. Há a dança e há a música. Há o telefone que toca com a voz da amiga querida do outro lado. Há as nossas gargalhadas. Há a nossa vontade de melhorar. Há a chuva batendo agora na janela. Há o mamá que vai rolar daqui a pouco. Há os nossos pequenos delitos, o chocolate nosso de todo dia. Há o trabalho e o tutu no fim do mês. Há o amor que arrrrrrrrde no peito. Há a vontade de ser e fazer feliz. De ir costurando um momento bom em outro melhor e em outro e em outro e em outro e assim acabar tecendo uma gostosura de vida. Sem sentido. Sentindo-se.