quarta-feira, 2 de julho de 2008

Vida após a morte

Tem uma propaganda por aí nos ônibus da cidade dizendo algo assim "há vida após a morte. Doe seus órgãos." Tenho lido e me lembrado de uma reportagem que li numa dessas revistas de bebê numa sala de espera de algum pediatra. Era simplesinha, mas dizia uma coisa que me rachou de emoção na hora e não esqueci mais. A mãe escrevia uma carta pro seu neném que ainda não tinha nascido, apresentando a família dela a ele. Ao falar da própria mãe, disse alguma coisa do tipo: "você não a conhecerá fisicamente, pois ela já se foi desse mundo, mas saberá tudo dela através do amor que eu te darei. Será, inevitavelmente, o mesmo amor que ela um dia me deu." Não sei se achei isso mais certo ou mais lindo. Me lembrei na hora de uma amiga minha muito querida, que já perdeu também a mãe. Quando eu a conheci, a mãe já tinha falecido. Mas quanto eu sei hoje dessa pessoa só pelo o que conheço da Grace (tinha nome melhor?). Já disse isso a ela. A inigualável bondade dela, o obstinado cuidado com os outros, a fortaleza impressionante ao meio de tanta delicadeza... Sempre, sempre tive essa impressão dela: de que a raiz desse jeitinho de ser maravilhoso era fruto direto do fato de alguém um dia tê-la amado muito, e amado certo, positivamente, sem tréguas e sem ressalvas. Ela é hoje o puro reflexo disso, ninguém me tira isso da cabeça. Então, esse alguém - que, por saber de sua história, sei ter sido sua mãe - já não está mais aqui entre nós, mas, nossa, está aqui entre a gente muito mais do que muitos outros. Seu amor lá de trás brotou e está em plena primavera. E sendo passado adiante, porque quando eu me encontro com sua filha, saio melhor do que cheguei, bêbada desse mel de fonte remota. Quem a conhece sabe do que eu estou falando.
Aí está a versão da vida eterna, ou da reencarnação, sei lá, que mais me convenceu até hoje. A qualidade e intensidade do nosso amor continuando a dar corda nas rodas do mundo independente do "fim" de nós mesmos.

ps: esse post vai dedicado ao Matthias, de quem eu acabo de receber um email fantástico, na emoção do qual, depois de quase dois meses de seca, consegui decolar um pouquinho e escrever aqui. (;

sábado, 3 de maio de 2008

Dói!

Minha tentativa de definição hoje pro sentimento de ser mãe passaria por algo assim: dói, meu deus, dói muito. É tum-tum-tum na porta o tempo todo. Mas eu não tô falando em dor, tô falando em sentir algo doendo - o que me parece poder ser sutil mas substancialmente diferente. Com doer quero dizer a sensação permanente de algo agudo latejando, da cabeça aos pés, do lado de dentro e do lado de fora, acusando sem trégua sua presença, sendo urgente, sendo pra ontem, sem chance de passar, sem cura. Esqueça, o bicho do amor louco te pegou, cravou a unha bem no meio do seu peito. O feeling é esse, que adoeci e que não tem mais jeito, viverei na palma da mão dessa doença boa que me sustentará. Não consigo mais me imaginar normal, tranqüilinha, bonitinha, assentadinha (nem infeliz, diga-se de passagem). Algo em mim desalinhou, encostou no infinito. Parece que, ali na sala do parto, acabei ouvindo um sussurro da vida com a vida que não podia: mais uma filha, mais uma louca que nascem (o par só pode ser esse, filha-e-louca; mãe-e-filha é puro disfarce). Tenho me lembrado muito das paixões da adolescência. Acho que já até coloquei isso antes aqui. Tem muito a ver: aquela certeza que o ar vai acabar se ele não olhar pra cá agora, se ele não entrar imediatamente por aquela porta, se esse bendito telefone não tocar. Pois é, filha, olha onde você foi colocar sua mãe. Do lado de fora do mundo, embolada neste tecido de que é feito a gente. Um lugar onde não existem mais as palavras, só esse tum-tum-tum do meu coração inteirinho dentro do teu.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

É tudo junto ao mesmo tempo

Todos os comentários que recebo, aqui ou pelo meu email, são pra mim maravilhosos. Só me confirma cada vez mais como a comunicação (verdadeira) com outra pessoa pode ser fantasticamente curativa. Mas o último comentário da Dani Guima vai ter que virar post - eu preciso ler isso aqui todo dia! Fundamental cair essa ficha do que ela escreveu sobre não haver linearidade em nada. Realmente, parece haver uma certa "obsessão classificatória" nossa, meio infantil, muito da equivocada, responsável por confusões férteis na nossa cabeça. É como se tudo ao nosso redor fosse possível de ser classificado em "bom" ou "mau", "feliz" ou "infeliz", "quero" ou "não quero". Acontece que a vida, na sua profunda riqueza, brinca com isso, misturando na química das coisas elementos aparentemente antagônicas. Quando a gente percebe que quer ser bom, mas também é mau; que uma pessoa importante pra gente tem suas coisas lindas e outras insuportáveis (e que nenhuma relação precisa terminar por causa disso); que um amor por mais lindo que seja é também sempre controverso etc. alguns nós difícieis de dentro da gente parecem ir sendo desatados... Sabe viver bem, acho, exige também isto de nós: é preciso saber mergulhar a alma de cabeça nas experiências em si, esquecendo de classificá-las, esquecendo de seus rótulos possíveis (leia-se, necessidade de entender)... Aí vai o tão lúcido post: (Valeu, Dani!)

Bia,
a minha experiência pessoal tem me dito que não dá para apressar em aprender logo a lição... faz parte a gente se sentir assim, meio que roubadas da nossa individualidade e egoísmo. E isso dói. Mas aí, no minuto seguinte, recebemos um super sorriso banguela e ficamos embriagadas de recompensamento. Acho que não existe uma linearidade - seremos super felizes de ser mães, ou super tristes de ter perdido as delícias da vida sem filhos. Tem um pouco de tudo nisso daí, a gente curte um pouco, lamenta um pouco, viaja quando dá, deixa com a vovó e toma um fôlego bom e volta para casa morrendo de saudades... é tudo junto ao mesmo tempo. Desisti de me sentir só bem sobre ser mãe, sabe? Assim como não dá para se sentir só feliz de sermos casadas com nossos maridos, ou 100% sobre nossa escolha profissional. O lance é ir passeando por essas situações sem se colar muito nem com as coisas boas, nem com as coisas ruins. E curtir o momento presente! Seja com ou sem nossas pequenas por perto! :D
Beijo grande para você, Bia!

domingo, 27 de abril de 2008

Contando à Camila, ela deu nome aos bichos: o negócio, Bia, é que a gente é muito hedonista e egoísta. Foi um certo alívio ouvir isso. Primeiro pela nossa apresentação - qualquer mal identificado, só por isso, já começa a melhorar. Segundo pelo "a gente" utilizado. É, talvez eu possa mesmo dividir estes "créditos" com uma geração inteira, uma época, um meio social etc. o que dá uma folguinha ao meu sempre vigilante superego. O fato é que tenho me visto às vezes vergonhosamente bastante jururu com as concessões que tenho que fazer por ser agora mãe de uma criança. Do jeitinho que eu temia que pudesse acontecer. Exemplifico. Esse fim de semana estaríamos em BH pra um super casamento de um amigão do Patrick. Só nós dois, curtindo e namorando, como a gente vem tanto precisando. Ia dar pouco mais de 24 horas fora, mas eram 1.440 e tantos minutos que estavam sendo planejados com a maior empolgação. Fora a festa, fiquei dias pensando se aproveitaríamos o tempo pra hibernar dormindo ou se, ao contrário, faria tudo e mais alguma coisa que tivesse rolando em BH. Pesquisei na Veja BH. Descobri que tava rolando campeonato de comida de boteco. Imagina se gostamos disso... Anotei endereços, montei toda a nossa programação. Beto e Ciça iriam junto com a gente também sem a filha - companhia melhor não haveria. Manú iria ficar com minha mãe, pela primeira vez tanto tempo, que tava feliz da vida com o fim-de-semana "all-inclusive-vovó". Tudo soando perfeito. Pois bem. Eis que de sexta pra sábado, Manú desenvolve do nada uma diarréia, sapeca em mim dois vômitos e marca 38, quase 39 graus, no termômetro. Ficou, tadinha, irritada, chorosa, dormiu mal, claro. E quem tem coragem de embarcar pra outra cidade? Nem pensar. Resultado: todo mundo lá, inclusive o pai (que não havia necessidade de também ficar e perder o casamento do amigo), e eu aqui. O mal-estar dela já passou, graças a Deus, mas o meu não - me sinto péssima de ter me sentido péssima por ter ficado. Mas é isso aí. E escrever aqui é uma tentativa mesmo de, assumindo isso, crescer nessa história (e, quem sabe, consolar um pouco alguém que um dia se veja na mesma situação). De fato, ser mãe tem sido a maior escola da minha vida. E eu acabo de tirar um MI feio na prova... A sorte é que não há escola com mais provas de recuperação que esta no mundo, para as quais eu preciso mais é, ao invés de só lamentar, me apressar em aprender logo a lição! (;

sábado, 5 de abril de 2008

Estamos dodói...


Ela de bronquite. Eu do coração.
Que dó sem tamanho dessa pequenina criatura, tentando respirar, tentando dormir e tudo tão difícil, tão entupido! "Opa, quem foi que mudou minha vida assim de repente?", certamente ela pensaria se pensasse. "Eu ficava com sono, fechava os olhos e dormia, era só puxar o ar que ele entrava, não tinha esse nariz assado de tanto escorrer, essa tosse que a toda hora me acorda...". É, filha, vai se acostumando aos mistérios - ah, e às mudanças também. Esse aí é mole, daqui a um par de anos você entenderá direitinho; e a mudança é temporária, daqui a uns dias, com certeza, pulmãozinho e narizinho vão estar zero bala de novo. Complicado mesmo são os tantos outros inúmeros mistérios por aí, sem explicação nenhuma e trazendo algumas mudanças pra gente totalmente sem volta...
Bom, mas eu ia falar de outra coisa.
O diagnóstico de bronquite da Manú chegou a mim acompanhado. Junto com ele vieram, de surpresa, visitas ilustres: uma certa vergonha e uma considerável culpa. Fiquei impressionada com isso, de repente estava eu, além de preocupada com o problema em si, numa culpa, numa vergonha de ter a Manú doente. O que fiz? O que não fiz? Ok, culpa de mãe é o assunto mais velho desse blog e de toda a maternidade se duvidar. Mas ontem ela me mostrou os dentes de novo. E pasmei comparando: alguma vez em que fiquei doente senti alguma coisa parecida com culpa, vergonha por estar doente? Nunca, nem mesmo com o HPV, que só por poder envolver sexo já deixa muita gente travada. Doente costumo sentir desânimo, carência, tédio, chateação por não poder fazer alguma coisa que queira, vontade de ficar boa logo - às vezes até alívio por poder descansar um pouco. Mas nunca senti culpa ("Ó-meu-deus, não vou contar pra ninguém que estou gripada!"), nem percebi ninguém me acusando de nada ("ah, olha só ela, que horror, ela não se cuida direito..."). Se há quem fale isso, o tom normalmente é outro, é o de ajudar, de te mostrar que era bom você se cuidar um pouquinho mais, não exagerar com trabalho, farra (ou falta de) etc., não de acusação - pelo menos não desta acusação que tô tentando falar. Interessante este "mudo discurso social": por que cuidar de si importa tão menos? Pelas premissas (cuidar de si é natural do egoísmo humano; temos que ser impelidos é a cuidar dos outros)? Pelas conseqüências (se você não cuidar de você mesmo quem suportará as onseqüências é você, então o problema é seu, mas se não cuidar do filho, é ele, e isso é injusto)? Pode ser, pode ser.
E enquanto Manú se recupera, eu tento também me recuperar, varrendo mais esse fantasminha inesperado do meu horizonte. Fantasminha muito perigoso pra mim, diga-se, pois me ataca justamente na jugular de algo que duramente conquistei nos últimos tempos e que vem me amortecendo nesta passagem pro universo materno: ter encontrado, ou achar que encontrei, o meu jeitinho próprio de ser mãe da Manú. Um jeito que aposta na simplificação, na leveza, na despreocupação (com tantos minimozinhos detalhes, recomendações e regrinhas), na aceitação dos meus limites e dos dela; na crença que um banho por dia, creme contra assadura, nossa alegria e nosso esfrega-esfrega de todo dia já seriam o suficiente pra imunizá-la de tudo. Nem tudo, pelo visto. O segredo parece estar - mais uma vez, de novo e também aqui - no velho, bom e tão só eventualmente atingido equilíbrio. Nem tão chata nem tão borrachona. Nem tão neurótica nem tão let it be. Nem só micróbios nem só vitamina "s". Nem só casa nem tanta rua. Nem tantos casaquinhos nem tanta perna de fora. Nem a mãe que faz tudo errado nem a mãe que faz tudo certo. Sempre a mãe que tenta. (:
ps: acima um momento delicioso da gente pra ver se a energia boa da foto enxota de vez esse baixo-astral dessa bronquite.

sábado, 15 de março de 2008

Humm... Interessante!

Não se podia esperar outra coisa desse tão podrinho mundo nosso do que não deixar nem mesmo nossos bebezinhos livres da cobrança da beleza. Assim que Manú nasceu, era impressionante perceber a ansiedade de algumas pessoas para medi-la, nesse aspecto, dos pés à cabeça. É assim com todo mundo por aí; inocente achar que fosse ser diferente com os pequenuchos. Tudo bem, releva-se. Faz parte do lado sombra da vida e da gente mesmo. Mas eu não deixo de ficar pensando... Que história diferente escreveríamos se toda essa neurose pela beleza física fosse dirigida pra outra coisa: imagine, ao invés dessa "endeusação" do ser belo e perfeito, o imperfeito interessante. Aliás, seria também mais inteligente, pois se tem algo que faz a diferença na vida de alguém certamente não é a beleza, mas sim o tanto que se é, digamos, interessante - o que pode até vir acompanhado da beleza, mas com certeza a prescinde. Pense em academias e academias na cidade com o objetivo de... te deixar mais interessante! Ser interessante, ou seja, um bom sujeito, leve, espirituoso, gentil, correto, com um jeito gostoso de gargalhar, falar, de andar, de dançar, quem sabe, um papo bom, bom-humor, um cacoete engraçado, umas neuras de estimação, uma bandeira qualquer, um poço mais fundo no olhar, um talento, um ouvido esperto... (Enfim, aquele cara que se quer sempre estar na mesma mesa de bar que a dele). Tão pouco a gente pode fazer pelo nosso, e pelos dos nossos filhos, invólucro (pelo menos sem correr o risco de um artificialismo ridículo)! Tanto a gente pode fazer pela nossa, e deles, capacidade de se tornar mais interessante! Que maravilha seria viver numa cultura onde essa aqui de fora recebesse mais trégua, desprezo até; onde houvesse sabedoria, tempo, olhos mais atentos pra caçar os gigantes de dentro...
Manú até que é bem lindinha. De uns ângulos mais, outros menos. Uns dias mais, outros menos. As pessoas às vezes me falam isso e eu fico, sim, envaidecida. Mas o que me explode de alegria mesmo é quando vejo nela, desde já, uma garotinha interessante. Curiosa, simpática, sorridente, ávida pelas coisas, topa-tudo, pouco exigente. Se conseguir seguir por aí, não tenho dúvida do destino feliz da minha filhota. Mais: de sua colaboração pra que esse mundo seja um tantinho mais... interessante!

segunda-feira, 3 de março de 2008

Simples assim


Às vezes tenho a impressão de que o mais complicado em bebês para nós é, paradoxalmente, essa extrema simplicidade deles. Não dá; nossos confusos sofisticados cérebros, alardeados para tão mais, parecem dar pau, não captar o espírito espartano da coisa.


Vejam só que seres mais lindos de simples e sábios. Gostam de quem gosta deles (absolutamente qualquer pessoa: sem requisitos de idade, sexo, cor, beleza, simpatia, idéias, jeito ou desajeito). Costumam não gostar de quem não gosta deles. Requerem, do dia, meia dúzia só de providências (tudo bem que repetidas n vezes): serem agasalhados, terem a barriguinha cheia, estarem limpinhos, terem um cantinho calmo pra dormir, receberem carinho e um pouquinho de diversão. Para o dia ser bom, nada demais precisa acontecer; ninguém precisa chegar, telefonar, convidar - basta o dia rolar sem sobressaltos. Se chover, ótimo; se fizer sol melhor ainda. Brincadeira? Qualquer pedaço de coisa que dobre ou faça barulho tá valendo. Bebês não disfarçam: tudo o que incomoda é anunciado na hora com choro - nunca estão nem aí pro que vão pensar deles. Contam com o amor e aceitação como certos; não patinam em qualquer dever de conquista. Não guardam mágoa nem remoem nada: assim que você desfizer o que estava incomodando, passam das lágrimas ao riso em segundos. Estão totalmente no presente, não se lembram do que passou, ignoram totalmente o minuto seguinte da vida. Você pode repetir a mesma gracinha um zilhão de vezes, eles sempre vão rir etc. etc. etc. (se a gente parar pra pensar, exemplos de simplicidade e sabedoria não faltam mesmo na vidinha dessa micro gente de uma perfeita linha só).


E a gente fica aqui ruminando se aquele olharzinho caído não é tédio; se aquela mãozinha afastando um beijo seu não é rejeição à mãe; se os estímulos - visuais, auditivos, táteis etc. - estão suficientes no dia; se a pintura da parede da casa não está enjoativa; se você não está enjoativa; se a vida do bebê não está enjoativa; pensamos em quando teremos dinheiro pra aquele brinquedão que promete ser a coisa mais legal do mundo; se estamos conversando com ele o tanto que precisa; se estamos sorrindo pra ele o tanto que precisa etc. etc. etc. (exemplos de complicação também é o que não falta na cabeça dessa gente grande embolada em tantos rabiscos desencontrados).


Eu queria muito saber: que hora, que bendita hora é essa, em que a gente se complica tanto e faz a vida ficar tão assim exigente e difícil?! Como diz uma amiga minha, a criança ao virar adulto não só evolui; em vários aspectos também involui. Definitivamente.


ps: uma coisa não é simples de entender na Manú: como pode essa criaturazinha já ter entendido que é pra rir quando uma câmara é apontada pra ela?? Impressionante, mas não se tira mais foto dela séria; esteja acontecendo o que for, ela vê a máquina e ri na hora, como aconteceu na foto acima esses dias...

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Olha que coisa mais linda a caminho do mar...

Acabamos de chegar da nossa primeiríssima viagem! Fomos a Salvador ao casamento da incrível tia de Manú, Renata Mesquita, agora assinando também Quadros. Que o casamento chocou de tão lindo e de tão verdadeiro, eu poderia falar. Que a energia indescritível da Bahia continua todinha lá, também poderia falar. Que eu descobri haver coisa pior ainda do que o meu pânico de avião - eu com pânico do avião tendo um bebê berrando no colo -, também é uma das historinhas dessa viagem que dava pra contar.
Mas, no meu arquivo emocional desses últimos dias, o que não me sai da cabeça mesmo é o encontro da Manú com o mar. Aquela coisinha minúscula branquela tocando seus mais minúsculos ainda pezinhos no colossal banhado do mar. Ele, que de vida sabe tanto, lambendo pela primeira vez as pegadas cambaleantes do que eu comecei entender de vida: minha pequenininha. Ela desconfiou, se assustou; ensaiou chorar. Ele fez que não era nada. Veio e voltou, espumando em branco de seu modo costumeiro. Ela foi se soltando, entregando aos poucos àquela banheira gigante suas pernocas, seus bracinhos, o corpinho inteiro. Desde os braços do pai, deixou-se ali por uns momentos. Não chegou a fazer farra, nem mesmo sorrir. Compenetrada, ficou só nessa primeira paquerinha com o mar - mar que, desconfio, lá em suas geleiras, se derreteu um pouquinho mais diante de tanta gostosura...
Segue abaixo o videozinho que a gente fez desse momento.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008


Há algum tempo surgiu essa conversa entre amigas:


Que filho precisa do amor de seus pais pra que fique tudo bem, ninguém discorda. Mas que precisa também ser um tanto esquecido por esses mesmos pais, poucos atinam (ou admitem).

A negligência, claro, escandaliza mais. Não podia ser diferente; suas conseqüências são indiscutivelmente terríveis e odiosas. Além de mais óbvias. Mas o exagero na atenção também causa seus males - talvez não menos terríveis.

O amor - ou a paixão, melhor dizendo - parece sempre caminhar na borda desse precipício: o perigo da febre desmesurada pela outra pessoa. Febre que não perdoa e vem sempre mofar o relacionamento: é inevitável faltar ar. Acontece toda hora no amor-romântico. Mas, repare bem, acontece também muito entre pais e filhos.

Tenho visto ser muito fácil, mas muito fácil mesmo, passar da dificuldade em lidar com a novidade de se ter um filho para a total obcessão por ele. Quer dizer, nem sei se a relação é a de sucessão mesmo entre uma coisa e outra; escrevendo agora, me pareceu mais capaz de ser uma coisa conseqüência da outra... Sei lá, o fato é que é daqui pra ali que a gente se enfia nesse enredo fadado à dor - nossa, do filho, da família.

O negócio é que amar alguém (ou pelo menos conduzir esse amor para a construção de uma coisa legal) implica em muito mais que não só "consumir" o outro ou se "consumir" para o outro. Exige que solidões, espaços, vãos sejam abertos, cedidos, dados de presente. Mesmo que dê cócegas, saudade, vazio, carência, ciúme. É a antiga lição: quem ama deixa livre! Não é fácil. Pede consciência, treino, recomeços, perdões. Parece que nossa tendência natural é só ter dois botões mesmo: liga 100% ou desliga 100% em relação a essas que são as pessoas essenciais da nossa vida (desliga?!). Continuar 100% mas, freqüentemente, descansar (e deixar descansar) no modo "poupando energia" é uma sabedoria a ser aprendida.

Em certas circunstâncias, isso é relativamente tranqüilo pra mim. Mas, em outros vários momentos, preciso fazer uma força danada pra "abandonar" Manú e deixá-la se ver um pouco sozinha com sua própria vidinha. Tenho convicção ser esse o caminho sadio. Não posso estar o tempo todo com ela, ter toda a minha atenção, meu prazer concentrado nela. É ruim pra mim; é péssimo pra ela.
"Preciso mostrar pra Manú que a vida é boa", foi uma frase que soltei outro dia e uma amiga minha tem sublinhado pra mim de vez em quando. Acho mesmo que essa seja uma das minhas maiores obrigações com minha filha. E pra isso eu preciso estar ligada no mundo, nos prazeres que ele traz, na vida afora a nossa. Preciso "esquecê-la".
ps: segue fotinha da dona do pedaço, que, a essa altura, já dá gargalhadas!

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Ruiva?!




Manú anda com um quê de ruiva. Nunca na vida poderia imaginar ter uma filha ruiva (tudo indica que o castanho prevalecerá, mas que por enquanto tem um arzinho de ruiva, tem, olhe só a foto aí).

Pensando nessa pequena excentricidade da mocinha, lembrei de uma coisa que passava muito pela minha cabeça na época da gravidez e agora, com a Manú aí, anda meio esquecida.

Nas cem milhões de vezes em que eu ficava imaginando quem era essa pessoinha que estava crescendo dentro de mim, me vinha o quanto eu não tinha o menor controle sobre isso. Com exceção de alguns extremos (um negão ou uma japa certamente dariam causa a um divórcio aqui em casa!), qualquer, absolutamente qualquer, "tipo" de pessoa poderia estar ali germinando em mim. Não só fisicamente, mas, principalmente e muito mais importante, em termos de personalidade, jeito de ser, gostos, talentos, fraquezas, problemas, até caráter. Claro que a criação da gente faria muitíssimo por ela; mas com certeza grande parte das suas tendências viria mesmo é de fábrica.

Tentava, então, concatenar este fato com outro, muito certo de acontecer também: o de que eu seria louca de amor por essa criatura "x", fosse quem fosse. Até se for chata, ranzinza, puxa-saco? Arrogante, fútil? Preconceituosa, vazia? E se detestar viajar, fazer amigos, ser mentirosa, egoísta? Não, não é possível que esse amor vá ser tão incondicional assim quanto dizem... Sim, é possível, não havia dúvida: minha filha - qualquer filha - seria um dos grandes amores da minha vida.

E aí me vinha isso de que um dos maiores "serviços" que essa criança já estava me fazendo era o de me abrir pra um amor e uma tolerância muito maior para com o gênero humano em geral; me ajudar a fazer de vez uma ligação direta entre humano = digno de amor, e ponto, sem mais as premissas dos qualitativos e medições.

Imagine só, essa menina antipática e estressadinha aí da porta ao lado, minha filha bem pode vir a ser igualzinha a ela. A que trabalha comigo e eu não vou com a cara de jeito nenhum. A chefe que eu não suportava. A idiota que me fechou no trânsito. A amiga que me alfineta me tachando sempre de louca de um jeito malicioso. A irresponsável. A ríspida. A ministra que rouba dinheiro público no cartão corporativo. Ainda que me ocorra "a Manú não vai ser assim, a gente vai tentar ensinar isso a ela, dar o exemplo daquilo", no fundo sei que mesmo as "melhores" educações podem dar muita zebra e que então qualquer dessas pessoas poderia muito bem sair da minha barriga.

E sendo minha filha, certamente eu iria amar e tolerar de toda maneira. Aliás, tirando os casos mais raros de séria negligência, mesmos as pessoas mais "erradas" do mundo têm/tiveram essa personagem central na vida, a mãe (ou quem quer que lhe tenha dado esse amor primeiro que nos estrutura); todas foram enxergadas, são enxergadas, por alguém(ns) para além de suas imperfeições e barbeiragens. Esse olhar diferente sobre elas existe em algum lugar. E saber disso faz com que automaticamente a gente as espreite um pouquinho desde esse ângulo mágico de suas mães, o ângulo de um amor maior.

Pode-se pensar que a mãe está tão egoicamente atada ao filho, que, pra não se desintegrar, cega-se à sua natureza, varrendo todo o lixo que vê bem pra baixo do tapete. Pode ser. Chuto, no entanto, uma hipótese mais "polianesca": quem sabe às mães (e pais - leia-se sempre), ao ser dada a hercúlea tarefa de tocar vidinhas pra frente, também não é dada, como instrumento para tanto, uma compreensão da natureza humana mais integral, rica e profunda do que a que rola aí na lógica rotulante e classificatória desse nosso mundinho. Uma compreensão que escancara as asas destes homens e mulheres pra que, debaixo, venha a caber qualquer pessoa: pretinhos, moreninhos, amarelinhos, branquelinhos... e ruivinhas! (=

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008




Sua filha também é filha do seu marido, neta da sua mãe, sobrinha da sua irmã, do seu cunhado, vizinha do seu vizinho, afilhada dos padrinhos dela, prima dos seus sobrinhos, "sobrinha" dos seus amigos, trabalho da sua babá, cliente do seu padeiro - e até neta da sua sogra ela também é! (=


Que me perdoem a obviedade (e a alfinetada na sogra...), mas sinto que o real significado desta simples constatação aí em cima pode demorar séculos pra se evidenciar pra gente. E, até lá, muita neura pode pintar.


Conversando outro dia com uma amiga, ela disse um negócio muito bonito que eu até já tinha tido a sensação e ouvido do pai, mas ainda não tinha conseguido eu mesma botar em palavras. Algo mais ou menos assim, que se ela acreditava mesmo que sua filha era, mais que sua filha, filha da vida (e ela acreditava), a decorrência lógica é que todo o mundo, em maior ou menor grau, compartilhava com ela um pouco da responsibilidade pela filha e, mais, do direito de tê-la ocupando o espaço dela em sua vida. E a gente, mãe, tem que permitir isso; não só permitir mas, enquanto se tratar de uma menininha sem muita vontade própria, incentivar, promover mesmo.


Pode parecer exagero imaginar quem assim não haja, mas não é. É muito comum a gente tomar o filho pra si e passar a tratá-lo como um seqüestrado, mediando o contato dele com o mundo inteiro com um cuidado pra lá de excessivo.


Muitas razões pra isso: falta de confiança nos outros, vontade (e pretensão) de protegê-lo de tudo, ciúmes, possessividade etc.


Comigo aconteceu um pouco disso. E o meu problema - vai entender - era pena. Bastante esquisito. Eu me pegava morrendo de pena de todos que dividiam comigo a lida com a Manú. Começava, claro, pelo pai. Eu deixava os dois sozinhos e já começava a pensar: "coitado, ela vai chorar! E ele não vai saber o que fazer! E vai ficar angustiado, cansado, deprimido até! Ai-meu-deus, deixa eu ir logo com esse banho!". De madrugada, quando ele não acordava espontaneamente, eu nem cogitava acordá-lo - "coitadinho, deixa dormir, já basta eu exausta!". (Um parêntesis aqui. Essa coisa de afastar o pai da história é bastante comentada. Mas sempre se diz que o motivo é achar que ele não vai fazer as coisas tão bem quanto você. No meu caso, juro, ao menos conscientemente, não era nada disso. Aliás, minha auto-estima como mãe demorou tanto pra se erguer que eu sinceramente achava que quase qualquer outra pessoa ia saber cuidar dela melhor do que eu. Eu tinha era essa coisa de ter pena.)


E não era só dele. Da minha mãe. Só deixava a Manú com ela se estivesse dormindo e eu tivesse razoável certeza que ia continuar assim enquanto eu não voltasse. Da babá. Paga pra isso, acostumada com a coisa e distanciada emocionalmente. Mesmo assim, vivia saltando uns "coitada!" na minha cabeça quando deixava ela correr na minha frente pra acudir um choro.


Não é tão difícil de entender o processo: eu devia era estar morrendo de pena de mim mesma e essa pena transbordava sendo projetada nos outros. Ok. Fácil de ver; difícil é mudar.


Um dia o pai me falou: você tem que pensar que as pessoas também têm o direito e a "obrigação" de experimentar a Manú e ter com ela as suas próprias ondas. É nossa filha, mas é também a netinha da sua mãe, do meu pai, do seu pai, sobrinha da sua irmã etc. Se ela está com eles e chora, não dorme, fica doente, dá trabalho, eles têm que tirar deles próprios um jeito, só deles, de consolá-la, de brincar com ela, de cuidar dela. Mesmo que seja com a melhor das intenções, você não tem o direito de negar isso a eles e, especialmente, a ela. É a construção da relação deles, que nada tem a ver com a gente, que está em jogo.


Verdade. É engraçado perceber que essas pessoas realmente têm seu próprio interagir com ela e às vezes pensam e fazem coisas maravilhosas que dão super certo e que, mesmo eu, que fico matutando sobre ela e seu comportamento o tempo todo, não tinha ainda atinado. E, quando nada, eles trazem pra ela o frescor de quem não está com ela o tempo todo, o que a embanha em energia boa. Ótimo pros dois.


O fato é que a vidinha de nossos bebês já são tão facetadas quanto podem ser as nossas. Eles já têm seus próprios papéizinhos no script da vida de uma porção de gente. E temos a responsabilidade (mais uma) de propiciar clima pra que isso se desenvolva! A experiência humana sadia é sempre múltipla, vária. A vida que se resume muito (numa pessoa, num ambiente, num papel só) empobrece perigosamente.


ps: Na foto Manú e parte de sua tchurma.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008


Não é mais ir ao cinema. Nem a mais animada das festas. Um show, nemmmm. O imbatível comer bem. Caminhar por aí. Não... Tem perdido até pras melhores rodas de cerveja ou os blasés momentos de um vinhozinho. Nada disso. Tenho que admitir que meu programa predileto agora é encontrar as mamães amigas e passar a tarde inteira falando, falando, falando, tagarelando, papagaiando, escarafunchando cada cantinho dessa tal maternidade! Eu sei, eu sei, soa meio mal, pequeno, bastante paranóico e totalmente bitolante. Mas pra ser sincera... Então lá vai foto de uma dessas deliciosaaaaaaaaaas tardes em que conheci Helena, uma semaninha só mais velha que Manú, filha da Raquel, amiga lá dos cafundós do Maristão. Gostoso demais!

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Viva João!

Dividindo coisa linda com vocês, ainda na alegria do nascimento do filhote da Mari, o João.
Carta de Hélio Pellegrino a Otto Lara Resende falando do nascimento da filha dele.

"Otto, meu querido amigo,

Nasceu Maria Clara, minha filha. Ela nasceu no dia 26 de novembro, tem alguns dias, portanto. Não lhes comuniquei nada, por enquanto, porque os fazia participantes silenciosos e solenes do Acontecimento. Há fatos – de preferência os mais irredutivelmente humildes – cuja verbalização é como que uma confissão de fraqueza, de isolamento e solidão. Sei que é assim mesmo, que nós, os homens, estamos por natureza impedidos do conhecimento sem palavras. Mas por sobrenatureza nos comunicamos, na Comunhão dos Santos, e esta é a razão por que os senti comigo no banquete da Efusão, do Mistério e da Humildade, quando do nascimento de minha filha. Aliás, o acontecimento é de tal maneira perfeito, exemplar, de tal maneira está pré-formado na sua antiguidade antiguíssima, que nada há que falar, assim como nada se fala quando a noite sucede o dia, quando as estações se sucedem ou quando os Mistérios da Vida e da Morte nos colhem de repente. Não estou comunicando a você o nascimento de minha filha. Que entre nós, sábios de amizade, se dispensem os cerimoniais humanos e se cedam ao signo e ao símbolo da própria Vida, que é calada. Para você, como minha filha é antiga! Como você a conheceu, sempre, em mim, na força de minhas contradições que buscavam expressão, na poesia de meus poemas, na minha crença em Jesus Cristo , na minha amizade, na minha tristeza, na minha vida! Ela era esperada, ela existia no meu Amor, nesse mesmo Amor que nos levantará da poeira dos tempos e nos suscitará a Unidade perene. O nascimento de uma filha é como o nascimento de um poema. E a poesia existiu anterior a nós mesmos, pairou sobre as águas, no princípio do mundo. Eis que conto para você uma velha história: nasceu minha filha. Ela se chama Maria Clara. Ela por um momento teve o mundo nas mãos, e os campos e os seres da terra se alimentaram de usa inocência. O pai, por um instante, vive seu coração nu, no berço, despido de tudo quanto é acessório, pequenino, fragilíssimo, ainda perfumado, sonolento e saudoso das searas eternas. Você, que tem minha amizade, será o padrinho de minha filha."

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

O tamanho da ajuda que você precisa


No meio do caminho da maternidade tem uma pedra - uma não, um monte, mas há uma especialmente penosa: as babás. Não me refiro à busca por uma boa, às dúvidas de qual esquema montar com ela, ao incômodo de conviver, mais perto do que nunca, com os abismos de oportunidades sociais/econômicas tão injustas etc. Mas, antes, falo da angústia que dá a questão de se assumir precisar ou não de ajuda (remunerada) pra cuidar da sua cria; ainda mais no começo; ainda mais durante a licença-maternidade.

Nessa história, a toda hora sobe do ralo o cheio de carniça das recriminações e, claro, da culpa, muita culpa. Ainda assustadoramente muito forte por aí falas do tipo "eu é que não botei filho no mundo pra babá criar!", "ah, deixando na mão de babá é fácil ter filho!".

Na minha modesta opinião, são estas frases mal-construídas e que dão margem à muita confusão na cabeça da gente. Desnecessária e sofrida.

Primeiro que criar um filho há de ser algo bem além de dar banho, vestir, trocar fralda, levar pra brincar, dar comida, velar sono. Tudo isso, claro, faz parte, ainda mais se tratando de um recém-nascido, mas o cerne do negócio é, intuo, outra coisa. Criar tem sim a ver com prestar cuidados concretos, mas principalmente com dar amor, aconchego, limites, orientação, aceitação, presença (muitas vezes não necessariamente obreira).

Temos que admitir, e respeitar, a existência de grandes mães e pais, cheios de amor pra dar e talento pra formar serezinhos muito bacanas, e que, por um motivo ou outro, vão precisar delegar, em maior ou menor grau, essas funções.

Segundo que ter filho, acho, não precisa ser imprescindivelmente uma coisa difícil ("com babá é fácil ter filho!"), precisa? Normalmente já vai ser duro e ralante de qualquer jeito, mas isso é pra ser minimizado e não cultuado, não?

Enfim, mais uma vez tá aí uma cultura que, criando rótulos e reduções, embota a capacidade de cada um de, a partir de si e do seu possível, pensar e encontrar sua própria forma, só sua, de fazer suas coisas e levar sua vida.

Quem é esse bebê que chegou? Exige muito ou nem tanto? Mama e dorme ou arde de cólica? Dorminhoco ou insone? Quem é você-mãe? Ou melhor, que mãe você pode e você quer ser? Tem facilidade pra cuidar dos outros? Tem pouco sono ou precisa dormir muito? É tarada pelo trabalho ou nem pensa nisso? Tem uma vida intensa fora de casa ou é naturalmente caseira? Até que ponto quer/precisa mudar? Até que ponto consegue, de um modo sadio, se sacrificar? Quem é o pai? Está ao lado? Entendeu que é pai ou viaja achando que o problema é mais seu? E a sua família? É gente próxima, que vai botar a mão na massa com você, ou indisponível, inexistente até?

No meu caso, eu morria de medo dessa parte operacional da maternidade. Meu contato anterior com RNs era praticamente zero. O pai idem. Tinha medo de coisas simples, como dar um banho ou ninar pra dormir. Tinha pânico, principalmente, dela chorar demais, dela não dormir, de eu pirar, sufocar com tanta responsabilidade e indisponibilidade.

Contratamos uma auxiliar de enfermagem, a Vera. Era pra passar um mês e acabará, no fim desse mês, passando três e meio. Pra gente (como somos, nossas famílias, nossos arranjos) foi fundamental. Mas eu me senti várias vezes entupida de angústia até conseguir ajustar o tamanho da ajuda que eu queria. Eu não queria, não quero, ser coadjuvante na vidinha da Manú! Por razões nobres e outras nem tanto, quero o protagonismo (no máximo, dividir as luzes com o pai...)! Então, quando a Vera assumia, tinha o medo básico dela não cuidar tão bem quanto eu. Mas tinha, muito mais, horror à idéia dela cuidar da Manú bem melhor do que eu. Tiveram dias em que, acomodada, deixei demais com ela. Outros em que, por insegurança e preconceito, deixei de menos e acabei estrimbuchava sem necessidade.

Fui aprendendo...

Arrumei na minha cabeça que a Vera estava aqui pra me poupar de duas coisas (e com relação a todas as outras o problema é só meu e o do pai mesmo): da exaustão de se cuidar, sem trégua, de um bebê e da minha ausência perigosa nas coisas essencias da minha vida que não têm a ver com a Manú. Claro que aí o xis: o que é realmente importante e o que não é tão importante, mas capricho e relutância pra admitir que a vida mudou; e onde termina o cansaço típico e do qual não se deve escapar e onde começa o esgotamento que vai me deixar histérica e perdida. Caso a caso, fui tentando, venho tentando, me afiar cada vez mais nesse discernimento, achando o nosso caminho.

De qualquer jeito, presto aqui a mais que merecida homenagem à super Vera, que tanto ajudou no desabrochar dessa mãe aqui! Acima, retratinho dela com Manú.

sábado, 5 de janeiro de 2008

"Áudio-cassetada" materna...

Eu sabia que em algum lugar já devia ter ocorrido algo assim. Eis que minha irmã me conta a história verídica de uma conhecida dela:

Família em peso vem visitar recém-nascido. Neném dormindo. Depois de darem uma olhadinha no fofucho, pai, vovôs, titias, priminhos, vão todos pra sala do apartamento. Menos a irmã da mãe, que fica com ela no quarto do bebê, à beira do berço, e lhe pergunta: "e aí, já voltou a rolar?". Na sala, família ouve a frase e se entreolha procurando quem perguntou. Antes de entenderem quem está falando e de onde, vem a resposta: "ainda não, tô com medo de arrebentar tudo aqui dentro, não tenho também muita vontade... e o pior é que ele não se conforma... quer agora, então, que eu libere o fiofó...". Família começa a entender o que se passa e a virar os pescoços vagarosamente na direção do fiofó-hunter. Este procura desesperadamente a babá eletrônica e não encontra a desgraçada, que foi posta no alto da estante, no meio dos livros, onde a mãe tinha acabado de descobrir pegar melhor o sinal. Conversa segue: "O fiofó é foda, ainda mais no pós-parto, esses homens são mesmo uns incompreensíveis!". "Pois é, mas não vai ter jeito, dia desses vou ter que liberar!". Pai-homem-insensível, petrificado na sala diante do olhar de nojo de todos (menos do sobrinhozinho que, ao invés, não pára de perguntar pro avô "vô-o-que-é-fiofó?vô-o-que-é-fiofó? vô-o-que-é-fiofó?"), tenta seu último recurso que é ligar a TV no volume máximo de qualquer coisa que esteja passando. Com exceção do esgoelamento da TV, um silêncio sepulcral se instala no ambiente. Mãe-prestes-a-dar e irmã-curiosa-demais atravessam a sala, não entendem aquele clima de sheet no ar, mas vão direto passar um café na cozinha...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Sumi!



Podia tranqüilamente botar a culpa nas festas de fim de ano que seria perfeito. Desculpa ou não, todo mundo parece ganhar uma certa moratória pra desaparecer sem ter que dizer muito o porquê nessa época do ano (não me contenho em exclamar que pena não ser bem assim o resto do ano, com o quê vejo o quanto essa história da (falta de) liberdade me é assustadoramente recorrente...).
Mas não é verdade. O fim do ano foi, pra nós aqui de casa, sem a cobrança da pirotecnia típica em razão da neném, ameno e fácil (e, talvez exatamente por isso, dos mais legais).
A verdade está no eixo desse blog: minha menininha. Tá tudo ficando tão bom, mas tão bom e só bom ao lado dela, que a necessidade de "caverninhas", como este espaço aqui, cedeu pra mim.
abobadamente apaixonada pela história de ser mãe (e eu que sempre senti nostálgicas saudades das paixões de adolescência... Mal sabia da força do que ainda estava por vir.).
Não me sai da cabeça aquele título do livro da mãe do Cazuza "Só as mães são felizes". Lembro quando li esse título em alguma prateleira de livraria. Me intrigou. Não só, me irritou um pouco. Achei meio limitado e puxando pra essa coisa careta de se achar que felicidade tem fórmula, com meia dúzia de acontecimentos imprescindíveis na vida pra ser considerada atingida.
E eis-me aqui confessando concordância com a frase. Com a ressalva da generalização, pois só posso falar da minha experiência, isso sempre. Eu é que honestamente nunca me vi tão feliz quanto agora, mãe.
Até que sempre me considerei uma sujeita feliz; os problemas topados por aí sempre estiveram na média e eu sempre senti um tesão danado pela vida, em suma. Mas, sem exagero, percebo agora que isso era um pálido rascunho de onde eu poderia chegar ou, melhor dizendo, onde ser mãe iria um dia me colocar.
Não é a Manú pela Manú. É o que ela abriu aqui dentro de mim. A imagem que me vem é de uma cachoeira do Iguaçu (acento?) represada por enormes e potentes muros que só deixavam escapar por entre uma ou outra rachadura um fiapo aqui ou ali d'água. Tudo bem que um fiapo da catarata do Iguaçu é água pra caramba - por isso, talvez, a sensação de que não era fiapo, mas uma razoavelmente volumosa fonte, bastante pra tudo. O fato é que esse muro desabou e, agora sim, eu descobri a força da catarata inteira que existia ali, atrás dos muros. É um amor, é uma vontade, é uma compreensão, é uma doçura, é uma sensibilidade inéditos, neste grau, pra mim. As pessoas, minhas pessoas, outras pessoas, meu mundo, outros mundos, todos estão mais coloridos, serenados, leves, simples, acessíveis, convidativos. O que é importante tem sido importantíssimo. O pequeno tem milagrosamente se recolhido à sua insignificância. O amor tá ocupadíssimo em só amar, sem muita ideologia nem delongas, amando pra valer e sem muita explicação. Como diz Zeca Baleiro, ando pensando em bater na porta do vizinho, mandar flores pro delegado, beijar o português da padaria.
É, sem dúvida, a melhor versão que eu já consegui tirar de mim mesma. Com certeza, em 13 de outubro passado não foi só Manú que nasceu... (=

ps: segue fotinha das duas próximas "felizes"...